Archive for the ‘Kiko’ Category

Encontros com Homens Notáveis

Era 1995, quando eu estava acabando o meu mestrado. Resolvi fazer a aula de linguística do Noam Chomsky, que é um senhor palestrista. Aliás, as palestras dele tinham um quê de Astros do Ringue ou Programa do Ratinho (fica à escolha do leitor), uma vez que sempre tinha algum fã ardoroso de Israel ou economista de Harvard na platéia para se levantar e largar o verbo no melhor estilo choro e ranger de dentes, ou seja, diversão garantida, pois o homem não levava desaforo para casa.

Mas as aulas de linguística eram bem menos polêmicas na época; hoje deve ser diferente, uma vez que de lá para cá um professor fazendo pesquisa com uma tribo na Amazônia descobriu uma linguagem que contraria completamente a teoria do Chomsky, mas isso é outra história. Tem uma reportagem muito interessante numa New Yorker de mil novecentos e antigamente sobre o assunto.

O problema na aula do Chomsky era que tinha um mundo de gente querendo fazer a matéria. Centenas de alunos. Daí no primeiro dia de aula ele avisou que não poderia aceitar toda aquela turba na sala de aula e que todo mundo ia ter que entregar uma redação explicando porque queria fazer a matéria. Ele leria todas e decidiria quem iria fazer a matéria.

Foi um Deus nos acuda. Alguns colegas meus que estavam fazendo a matéria juntos saíram a pesquisar a história inteira da linguística, a Forma Normal de Chomksy e suas aplicações na inteligência artificial, a relação entre o “Mentalês”, a língua primordial com a qual todos nós já nascemos de acordo com a teoria Chomskyana, e a teoria da “Sociedade da Mente” de Marvin Minsky. Escreveram verdadeiros tratados.

Eu escrevi um parágrafo de 3 linhas dizendo que adoraria fazer a matéria porque só me faltava um crédito para poder concluir o meu mestrado e que senão eu teria de esperar mais um semestre para me formar.

Os meus amigos foram ejetados da matéria mas eu fiquei. Valeu, Chomsky camarada!

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De volta

Pois é, tenho andado ocupado e este blog abandonado. Trabalhando feito um louco no web site que eu vou lançar djá djá, contruindo o paddleboard para a corrida no Hawai’i em Julho e organizando um mini festival de curtas aqui no galpão.

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E, recentemente, o Billboard Liberation Front remixou mais um outdoor aqui em San Francisco.

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E ontem, houve um jantar em benefício da campanha de Cindy Sheehan ao Senado, concorrendo contra Nancy Pelosi, que é a líder da bancada Democrata no Senado. Veio a própria e um monte de gente, mas eu estava com preguiça e não tirei nenhuma foto.

E só. Câmbio e desligo.

Resoluções

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– Conquistar a Europa, a Oceania e um outro continente à minha escolha.

– Descobrir de onde raios vem a expressão “Hubba Hubba”.

– Emplacar o kimono como a última moda dos descolados de San Francisco. Se não der certo, tentar o poncho.

– Usar o fio dental continua sendo opcional, mas passa a ser altamente recomendável.

– Encontrar prazer nas pequenas alegrias do cotidiano, como negar esmolas a mendigos.

– Tomar cuidados com o corpo, como por exemplo não esbarrar em pessoas e/ou objetos. Se possível, tentar não cair de clarabóias (aconteceu em 2007..)

– Segunda Divisão também é cultura. Avante Coringão.

– Continuar a luta pela erradicação da pobreza deixando objetos de valor à vista dentro do meu carro quando eu o estaciono no Lower Haight.

– Trabalhar como se ninguém estivesse olhando, amar como se eu não precisasse de dinheiro, dançar como se eu nunca tivesse sido sacaneado.

– Ver o sol nascer mais vezes. De preferência, sem estar deitado na sarjeta com um vira-lata lambendo a minha cara.

– Passar no curso de Semiótica Desconstrutiva de Charges & Cartoons do Frankenstein Jones. Depois, ler os quadrinhos da New Yorker e dar risada como se eu tivesse entendido.

De 0 a 100 em 2 segundos

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Um dia você está DJzando nas montanhas da Califórnia. Entre um e outro CD (e uma cervejinha também que ninguém é de ferro) você bate papo com um amigo. Mais tarde naquela noite, você pega o violão, o amigo pega o saxofone e você fazem um som. Vocês falam, totalmente da boca prá fora, que “nós devíamos montar uma banda um dia desses”. Daí você volta para San Francisco e nada acontece por algumas semanas até que um dia você recebe um email do amigo chamando para o primeiro ensaio. O cara arregimentou uma seção de metais, baterista, teclado, duas vocalistas e um bando de dançarinas de cabaré(!!)
Você entra com o baixo. Tudo bem. Vocês ensaiam por um mês, gravam uma fita demo até que um dia o amigo diz que arranjou o primeiro show da banda.

Na véspera de Ano Novo. Na maior festa de Ano Novo em San Francisco.

Para um público de 8000 pessoas.

Com 4 ou 5 ensaios.

Briga de cachorro grande, com bandas conhecidas, DJ’s famosos. E nós lá no meio. Tocando jazz e soul music tipo Motown. Só espero não levar a maior vaia. Não que eu nunca tenha levado vaias, levei várias. Mas nunca de 8000 pessoas. Ai meu São Cipriano.

Um Feliz Natal Para a Senhora Sua Mãe Também

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Acabei reciclando o cartão do ano passado porque estou sem paciência para fazer um este ano. “Eis-lo”. Considerem-se desejados um feliz Blá Blá Blá e  próspero Tonga da Milonga do Kabuletê.

O dia em que eu fui sequestrado

Dez da noite ontem, quatro da manhã no Brasil.  Toca o meu celular, chamada da casa dos meus pais.  Com meus pais já numa certa idade, é o telefonema que eu não quero receber.  Atendo já me preparando para o pior.  É a minha mãe.  Muito nervosa.

Aparentemente, eu fui sequestrado.  E os sequestradores ligaram para os meus pais e me botaram para chorar no telefone.  E queriam cinco mil reais.  Pô, eu acho que eu valho mais que isso.

Já tinha ouvido falar desse golpe, ontem chegou a minha vez.  Ainda bem que os meus pais souberam conduzir a coisa e ligaram para mim e para a polícia.

Eu reclamo prá caramba, mas eu vivo em um lugar onde eu posso ir às duas da manhã tirar dinheiro do caixa eletrônico sem problemas.  Onde eu paro no sinal vermelho de madrugada, sem ter que olhar para todos os lados.  Onde eu posso andar pela rua escutando o meu iPod numa boa.  No fundo, eu sou um cara de sorte.

Passe a Caninha Jamel, por favor

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Depois de todos estes anos fora do país, ainda dói. Isso sem falar no aluguel de São Paulinos, Flamenguistas e Aquele Outro Time Cujo Nome Não Será Mencionado e Que Levou Uma Piaba de 3×1 Ontem.   O jeito é pensar em dias melhores, como os da foto acima.

Faço minhas as palavras do Juca Kfouri. E só.

Despertencendo

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Se por um lado eu moro aqui há 15 anos, aqui nunca vai ser a minha casa. Nunca aprendi a gostar de baseball ou futebol americano. Futebol para mim, é e sempre será o do Corinthians. Mas adotei o Thanksgiving numa boa. Um dia em que você convida os amigos “órfãos”, passa o dia na cozinha, assando perus, fazendo tortas, bebendo cerveja e jogando conversa fora sem o consumismo do Natal.

Ao mesmo tempo que às vezes sinto falta do Brasil, sei que não há mais como voltar. Ao longo desse ano descobri que a grande maioria das pessoas que eu chamava de amigos no Brasil são na verdade conhecidos, gente com quem você toma uma cerveja e bate um papo, mas de quem não deve esperar nada mais. Enquanto isso, os meus amigos Americanos (que os Brasileiros gostam de chamar de “frios”), esses sim estavam lá quando eu precisei, mesmo os que moram longe.

Estudei e trabalhei no Japão, na Inglaterra e no Canadá. Saí do Brasil com 22 anos. Não conhecia ninguém nesse país quando cheguei a Boston no dia 26 e Agosto de 1992. Hoje eu penso em Inglês e o Português só é usado quando encontro alguns dos poucos amigos Brasileiros aqui, falo com os meus pais e escrevo neste blog. No Brasil, só a família e alguns amigos de verdade que se contam com os dedos de uma mão.

Estou acostumado a nunca fazer parte de nada. No Brasil, vi logo que não tinha paciência para pagar a cervejinha do guarda, a gorjeta do flanelinha e fazer parte das panelas de que é necessário participar para se chegar a algum lugar profissionalmente. E muito menos lidar com a comédia do absurdo que é ser Brasileiro fazendo piadinhas. Por isso vim para cá. Com todos os defeitos, o conservadorismo, a jequice, a falta de interesse pelo resto do mundo, ao menos por aqui existe alguma meritocracia. E algum espírito de justiça, se não para os outros, ao menos internamente.

Mas às vezes cansa não ter raízes em lugar nenhum, ficar flutuando no vácuo, sem ligações profundas com lugar algum. Por causa de toda a confusão deste ano, não posso sair do país. E vou ter que passar as festas de fim de ano por aqui mesmo, a primeira vez desde 1996, quando fiz o trajeto de Sydney a Perth, na Austrália, surfando e acampando na costa Sul. Acho que vou ignorar as festas de fim de ano solenemente desta vez.

Mudanças

Depois de três anos construindo todo tipo de engenhoca, de lesmas gigantes de metal a chuveiros de fogo controlados por computador no Shipyard em Berkeley, chegou a hora de trocar de ares. No fim de semana passado, o Instituto Caboclo Pai Jaú de Tecnologia, Funilaria e Pintura, do qual eu sou fundador, presidente e único membro, mudou a sua sede para um container na Box Shop, em San Francisco. Fica a dez minutos da minha casa e o meu container fica do lado do atelier da Jenn. A Jenn está trabalhando em um novo projeto dela, o Bayview Art Patch , que vai revitalizar um espaço público com esculturas fabricadas com peças de automóveis na área mais pobre e violenta de San Francisco. E eu vou ajudar como operário padrão, na fabricação em metal. O casal que constrói coisas junto permanece junto, ou leva um ao outro à demência, um dos dois.  Veremos.

O meu primeiro projeto na Box Shop será construir o paddleboard com que eu vou cruzar os 58 km entre Molokai e O’ahu em julho do ano que vem. Depois tenho que terminar a minha série de stêncils para a minha primeira mostra individual em Fevereiro em San Francisco. E ainda tenho dez dias pela frente em alto-mar no meio disso tudo. É bom estar ocupado.

A Box Shop é também o lar das Flaming Lotus Girls, que acabaram de voltar do Robodock, um festival de arte industrial em Amsterdam. E agora estão a caminho da Austrália. E mais para frente, Coachella. Ocupadas estas meninas…

Eu e o Mar

O ano de 2007 vai ser lembrado, entre outras coisas, como o ano em que eu redescobri a minha paixão pelo oceano.
Voltei a megulhar, tenho surfado com muito mais frequência e finalmente consegui a minha licença de capitão para barcos de até 32 pés.
Agora estou estudando navegação celestial que é o equivalente a estudar Latim no mundo da vela. Com GPS, não há mais necessidade.
Mas eu sempre quis aprender, desde pequeninho, a usar um sextante. E vai que um dia você está no meio do Oceano Pacífico e a sua
bateria morre. E aí, como faz?

Daqui a 3 semanas, vou ajudar um amigo a trazer o barco dele para San Francisco, que está vindo das Ilhas Virgens e agora se encontra na Nicarágua depois de cruzar o Canal do Panamá. Vou ser a tripulação na última perna, de San Diego a San Francisco, 10 dias no Pacífico Norte a 300 milhas náuticas da costa num catamarã Leopard de 45 pés. Todo mundo que já fez essa viagem me disse a mesma coisa: que eu vou ficar 1) Entediado e sem ter o que fazer 2) Apavorado se houver uma tempestade vinda do Golfo do Alaska, comum nessa época do ano e 3) Com muito frio e muito molhado. Parece um senhor programa de índio. E eu me amarro num programa de índio. Vou levar o meu livro de navegação, o meu calhamaço sobre como amarrar todo e qualquer nó no universo e o meu iPod. E deu.

Neste fim de semana eu fui velejar na Baía. Pegamos ventos de até 25 nós entre Alcatraz e Angel Island. Se você nunca navegou um barco com água subindo pela proa e com metade do corpo para fora do railing e o barco querendo virar mas não virando, você ainda não viveu. Ah, e um cargueiro coreano se chocou contra um dos pilares da Bay Bridge e derramou 58.000 galões de óleo. Já morreram cerca de 400 aves marinhas e o óleo está em toda a parte. A Jenn passou o domingo inteiro ajudando a retirar o óleo em Ocean Beach. Voltou para casa parecendo uma borracheira. Mas que borracheira…

Em Julho do ano que vem, vou participar da Molokai to O’ahu paddleboard race no Hawaii. São 32 milhas náuticas (58 Km) no canal de Molokai, famoso pelas suas correntes e ondulações. Depois de ter cruzado o Canal de Maui a nado (18 km) em 2004, acho que dá para encarar. O paddleboard é como uma prancha de surf, mas muito maior (a minha tem cerca de 4.5m de comprimento) e tem um casco ao contrário de uma prancha comum, que tem o fundo mais ou menos plano para deslizar sobre a água. O paddleboard corta a água. E é possível surfar ondas no mar aberto com ele. O problema é que eu não tenho um paddleboard. Então ou eu teria que gastar cerca de $3000 dólares por um novo de fibra de vidro ou fazer um eu mesmo comprando a madeira, os planos e instruções por cerca de $600 dólares.

Adivinha qual eu escolhi? Fazer a sua própria prancha e cruzar o oceano com ela é muito mais interessante, uma coisa tipo assim um Amyr Klink dos pobres, não?

Aqui vai um vídeo sobre paddleboard. Dá para ver o pessoal surfando a ondulação e alguns de pé com o remo, no antigo estilo Polinésio.